Retrospectiva Final

Por Henrique Cesar Tupper

A ansiedade pelo término do WCT desse ano de 2014 me lembrou a de uma torcida de um time de futebol ao virar do primeiro para o segundo tempo vencendo por um a zero. Faltava pouco, mas nos últimos 45 minutos tudo podia acontecer.

Independentemente da atuação de Alejo, que foi fundamental para a coroação brasileira ao vencer Fanning, Medina foi brilhante mais uma vez durante a etapa de Pipe. Chegou a final e fez aquela final.

Vale ressaltar sim o mérito do Alejo ao vencer Slater. Mas que fique claro que essa vitória, em nada ajudou ao Medina, pois o Slater já não poderia ultrapassar o brasileiro no ranking final.

No tocante a bateria final, acredito que o Medina só não foi campeão do Pipe Master por erro dos juízes: ao dar 9,93 para a primeira onda do Julian Wilson, os juízes não tinham como dar uma nota maior que 10 para o tubo deep do Medina para direita de backdoor. Assim, ao juízes overscored a primeira onda do australiano, não havia nota diferencial que avaliasse de forma adequada a primeira onda do brasileiro.

De qualquer forma, Medina fez história também em Pipe, alcançando a melhor posição de um brasileiro. Aliás, que história: ser vice campeão em Pipe alcançando 19,20, em uma final até a última onda.

Algumas análises podem ser  feitas das etapas realizadas ao longo do ano de 2014:

Medina é um monstro de habilidade. Sabe realizar durante as baterias todas as manobras aéreas, entubar e demais manobras clássicas

Medina é um monstro tático nas baterias: o que ele fez na final de Fiji, e o nervosismo de Slater na final de Teahoopo são sinais de maturidade competitiva;

Medina surfa e entuba muito bem para direita: eu mesmo tinha dúvidas se a ondulação fosse para backdoor (direitas) ele performaria bem. Bobagem. Tirou um 10 na final e arrebentou de backside contra o Filipinho e Josh Kerr, no Round 4 do Pipe master. Não podemos esquecer que ele estraçalhou em Snapper rocks no início do ano, local em que um goofie footer estrangeiro não vencia há mais de uma década;

Felipe Toledo parece que vai dar trabalho para os concorrentes no próximo ano;

Algumas dúvidas temos para o próximo ano:

  • Se o John John Florence aprender a competir da mesma forma que ele surfa? Seria ele imbatível? Na minha opinião ele é o surfista mais completo e o que mais empolga. Mas taticamente ele não consegue reverter o surf dele em bons resultados;
  • Slater continuará a competir no WCT ou se dedicará ao sua empresa? Essa é minha dúvida;
  • Até quando Charles continuará acompanhando Medina de perto? E se deixar de acompanhar, Medina continuará sendo um monstro tático nas baterias? Lembro da relação Larry e Guga no Tenis. Me parece natural haver uma maior independência atleta-técnico com o passar dos anos;
  • O feito do Medina atrairá patrocinadores para o campeonato brasileiro de surf profissional? Pergunto isso pelo fato de que hoje me parece que há um apagão de campeonatos no Brasil. Sem campeonatos não há renovação e sem renovação não haverá novos Medinas;

Muitas dúvidas para um novo ano que vem.

Por fim, gostaria de registrar o meu agradecimento aos nossos editores do Surf 100 Comentários que, na minha opinião, estão recompensados com esse título mundial do Medina: Alexandre Guaraná e Marcelo Andrade.

Ambos labutam no surf há décadas. Guaraná durante anos foi a minha fonte de leitura mensal através dos seus textos nas mais diversas mídias especializadas. E tenho certeza que o seus textos foram inspiração para diversos novos surfistas que queriam aprender um pouco mais do esporte.

Marcelo, por sua vez, ao invés de investir em uma carreira de economista, optou por dedicar toda a sua energia na organização do circuito brasileiro de surf profissional durante 10 anos. Um circuito com altos e baixos, mas que formou diversos surfistas que hoje estão aí.

Imagino a emoção dessa dupla ao ver um surfista brasileiro ser campeão mundial. Parabéns Medina, parabéns Guaraná, parabéns Marcelo e parabéns família ‘du surf”.

O surf brasileiro comemora o sonhado título de camepão mundial, conquistado por Gabriel Medina Photo: @kirstinscholtz

O surf brasileiro comemora o sonhado título de campeão mundial, conquistado por Gabriel Medina Photo: @kirstinscholtz

Plim! Plim!

Passados alguns dias da brilhante conquista de Gabriel Medina no Hawaii, dei uma pausa e começei a deixar a emoção de lado para raciocinar no que aconteceu nos últimos dois meses. Desde que o paulista ficou próximo de sagrar-se campeão mundial de surf profissional, a Rede Globo (TV, site, jornal) focou no garoto de tal forma, que a exposicão dele foi alçada a de um herói olímpico, se não tiver sido maior.

Não sou contra isso, ao contrário, Gabriel ou qualquer outro atleta vencedor de qualquer outra modalidade, merece todos os louros e reconhecimento pelo simples fato de que no Brasil estes exemplos de brasileiros passam o pão que o diabo amassou em grande parte da carreira. Nada mais justo que sejam elevados a categoria de semi-deuses. Mas já sou macaco velho e este tipo de exposicão, vindo de uma empresa gigantesca de comunicação, que faz jabá até em novela, não me parece apenas para criar e divulgar mais um ídolo nacional.

Já trabalhei em uma grande editora e sei que o faturamento, ainda mais nestes tempos econômicos complicados, exerce uma pressão enorme nas pautas, sejam esportivas ou de entretenimento. Isso pode até parecer antiético, mas não é, ao menos há algum tempo. Ficou esquisito, para mim, ver matérias grandes sobre Gabriel no Jornal Nacional e até chamada do evento nos intervalos da novela Império, horário mais do que nobre da TV brasileira. Uma propaganda de 30 segundos nesta faixa custava, há dois anos, cerca de 500 mil reais. Uma baba! Quanto você acha que a Rip Curl (estampada na camisa que o campeão mundial vestia) teve de retorno na entrevista ao vivo no JN, no sábado, dia 20 de dezembro, que durou cerca de 5 minutos? Também não estou aqui criticando a Globo por fazer um belo trabalho de jornalismo. Só não acredito que tenha sido porque a família Marinho pega onda. Tudo na vida tem um preço. E esta exposicão maciça não foi de graça.

Medina conta hoje com alguns patrocínios fortes como o Guaraná Antárctica (Ambev), Gillette (Procter & Gamble) Mitsubishi, Oi e Samsung, todos excelentes anunciantes da Rede Globo. Uma pressão desta galera poderia ser suficiente para mandarem uma equipe grande para o Hawaii no intuito de cobrir o tão esperado título mundial? Talvez, porém ainda acho que tem mais coisa.

Em novembro passado, rolou um Prime em Maresias, terra natal de Gabriel. O evento, o O’Neill SP, foi um sucesso. Pra quem não sabe, a Billabong pulou fora da etapa brazuca do WCT, atualmente realizada no Rio de Janeiro. O campeonato, basicamente bancado pela Prefeitura da Cidade Maravilhosa, está em compasso de espera, pois circulou pelos bastidores que em 2015 os promotores só contariam com a metade da verba dada anteriormente pelos políticos. Bem, isso foi antes de Gabriel se tornar o novo herói do Brasil.

Só que não me surpreenderia se o campeonato fosse para Maresias, bancado pelas marcas que apoiam o número um do mundo, com uma divulgação (diga-se de passagem mídia comprada) ainda maior da Globo. Pode ser um devaneio de minha parte? Sim! Mas impossível não é. Maresias tem excelentes ondas em maio, coisa que até agora não rolou no Rio. Maresias tem a família Medina e seus amigos. O Estado de São Paulo, junto com a Prefeitura de São Sebastião podem facilmente investir numa etapa do WCT, ainda mais com grana de publicitários que viram o surf ressurgir das cinzas na grande mídia (justiça seja feita, por causa da Rede Globo).

Tem um monte de gente que acha que o surf não deve se popularizar, pois com suas almas egoístas, não pretendem dividir o line up com mais surfistas. Mal sabem que a falta de educacão, um dos maiores motivos pelo preconceito que os viajantes brasileiros sofrem no exterior, é que torna o outside um lugar inóspito e com energia ruim. Por isso, mesmo achando que tem algum esquema em tamanha divulgacão, fico feliz que o surf retome seu lugar de direito entre os esportes. É uma atividade linda, natural, pacífica e saudável. E merece atenção de todos.

Já sei que grandes anunciantes estão voltando a procurar os dirigentes da ABRASP visando voltar a investir. Lógico que em moldes mais modestos. Que seja, pois para se chegar no topo da escada, tem que dar o primeiro passo. Se isso acontecer, os surfistas profissionais, omissos até agora, devem aplaudir, ler e assistir aos jornais, sites e programas de TV da Globo, 25º maior grupo de mídia do planeta em 2012 (dados: organização germânica IFM – Instituto para Políticas de Mídia e de Comunicação). Afinal de contas, foi a Plim Plim, personificada como Papai Noel, que deu o maior presente de natal para o surf no Brasil: a ressurreição.

Será que o WCT do Brasil pode parar Maresias ? Foto: Smorigo

Será que o WCT do Brasil pode parar Maresias ? Foto: Smorigo

 

Não Estou Sonhando

Em seu primeiro discurso como campeão mundial do WCT, Gabriel Medina falou do seu grande sonho que acabava de se realizar. Fiquei bastante emocionado ouvindo suas palavras, pois o sonho não era só dele, era nosso também. Foram anos imaginando quem seria o atleta que quebraria esse encanto. Achei que seria o Adriano de Souza por suas conquistas e sua personalidade forte de vencedor. Na minha opinião, ele foi o grande nome depois de Fabio Gouveia, que nos fez sonhar com um título para o Brasil. Adriano contribuiu muito para subirmos mais um degrau em nosso merecido lugar de potencial mundial. Continuo a acreditar que ele pode ir mais longe do que já foi, mas isso vamos deixar o tempo nos dizer.

A conquista de Medina foi épica, principalmente pela maneira com realizou. Surfou de forma avassaladora as esquerdas de Pipe, assim como as direitas do Backdoor. Mostrou muita maturidade em suas baterias, e nem nos momentos mais adversos se desesperou. Imaginávamos antes do evento que John John poderia ajuda-lo a desbancar Kelly Slater e Mick Fanning, mas quem fez esse feito foi outro brasileiro, Alejo Muniz. Medina fez sua parte de maneira brilhante e seus adversários diretos sentiram isso. Kelly Slater deu adeus no terceiro round, já fora da corrida pelo caneco. Mick Fanning vinha passando as fases sem convencer, até encontrar com Alejo. Medina, ao contrário, estava tão iluminado, que mesmo saindo de sua bateria das quartas, para comemorar o título, voltou para água faltando 15 minutos para o término e venceu seu compatriota Filipe Toledo. Filipe é uma grande esperança brasileira, apontado por muitos como um futuro top 5 do circuito, e quem sabe, campeão mundial. Fez uma grande exibição em Pipe, mas o dia era do nosso campeão. Na semi final Medina despachou o perigoso Josh Kerr com muita categoria. Julian Wilson foi seu adversário na grande final.

Meu sonho estava se tornando uma realidade maravilhosa. Teriamos um campeão mundial e um Pipemaster ?  Gabriel Medina seria o vencedor das 3 esquerdas mais difíceis do planeta? Fiji ,Teahupoo e Pipeline ? Algum brasileiro imaginava isso antes do ano começar ? Sinceramente dúvido. Infelizmente Julian Wilson me acordou com sua última onda surfada, um tubaço. Achei a bateria muito disputada, mas ficou um gosto de água no chope, principalmente pelo tubo nota 10 que Medina pegou para o Backdoor. O filme de Portugal, quando Julian virou nos últimos segundo de bateria, voltou a minha mente. Será ? De novo ? De novo. Não estragou a festa da torcida mais vibrante que Pipe já viu, mas nós mereciamos um final barba, cabelo e bigode, não acham ?

Por falar em barba, cabelo e bigode, levamos tudo. Gabriel Medina é o campeão do WCT, Filipe Toledo do WQS masculino e Silvana Lima do feminino. Como os gringos vão reagir a nossa invasão? Somos uma potencia mundial do esporte em todas as modalidades como falei em meu útlimo texto, 9 pés.
O trabalho que o Brasil fez durante tantos anos foi recompensado. Muitos lutaram por isso, principalmente pessoas que acreditavam que algo maior poderia acontecer. O sonho de Medina era o nosso também, e de todos os brasileiros que amam o surf de forma inexplicável. Neste momento penso nos atletas que abriram as portas no tour, quando ainda eram um pouco discriminados; nos juízes que trabalharam comigo e faziam seu trabalho por amor, pois seus salários não condiziam com suas responsabilidades; nos produtores de eventos que sofriam para nos dar um pouco mais de conforto; nos humildes montadores de palanques, que ficavam sol e chuva prontos para nos ajudar; em atletas que não tinham dinheiro nem para comprar seu jantar. Todos que  lutaram com coração por este esporte  merecem  muito um campeão do tamanho de Gabriel Medina.

Obrigado Medina por realizar o nosso sonho !!

O sonho se realizou. Foto: ASP/Kirstin

O sonho se realizou. Foto: ASP/Kirstin

A Invasão

São pouco mais de 21h30 do dia 19 de dezembro. E estou assistindo uma coisa que nunca imaginei que veria em minha vida: brasileiros dominando as areias de Pipeline. São dezenas de bandeiras, cantos de torcida e um garoto iluminado sendo ovacionado. O lugar onde os brazucas já foram agredidos, perseguidos, intimidados, virou arquibancada do Maraca. Gabriel Medina, como se imaginava, sagrou-se o primeiro campeão mundial de surf profissional brasileiro.

Photo: @kc80

Photo: @kc80

A tensão vista no seu semblante não foi suficiente para atrapalhá-lo. O exército de jornalistas, fãs, puxa-sacos, não foi capaz de tirá-lo do seu objetivo desde a surpreendente vitória em Snapper Rocks, na Austrália. Quem tremeu, foram Kelly e Mick, ambos múltiplos campeões do mundo, que foram despachados pelo Lancelot do Rei Gabriel, Alejo Muniz.

Foi um ano de sonhos, com um primeiro semestre espetacular, responsável por lhe dar tamanha vantagem no Hawaii, sempre complicado. Além do inegável talento, contou com uma série de acontecimentos a seu favor, desde a incrível não classificação de Jamie O’Brien no trials, que poderia ser um pé no saco em possíveis confrontos nos Rounds iniciais, até a performance inspirada de Muniz vencendo seus rivais na disputa pelo caneco.

Photo: @kirstinscholtz

Photo: @kirstinscholtz

Mas o que valeu mesmo foram seus três belos tubos para o Backdoor, que mesmo pequeno, exigiu uma técnica apurada, digna de um tube rider nato, sem tempo para treinar in loco, mas com a ousadia de alguém que não desiste. Apesar de Pipe não quebrar no dia final do jeito que todos gostariam (parecia o melhor dia da Cacimba do Padre em todos os tempos), Gabriel usou e abusou do faro para tubos, construído nas boas ondas de Maresias e aprimorado nas bancadas de corais mundo afora.

Uma festa coroada com a atuação soberba no último evento da temporada, onde os Top tiveram que encarar as versões Netuno 8 ou 80, com ondas dos 3 aos 15 pés fechando. Coragem, inteligência, obstinação e sobretudo um suporte da família, principalmente do padrasto, que mostrou muito equilíbrio, tranquilidade e instinto paterno, tomando cuidado para que seu enteado pudesse sentir-se amparado no meio de um turbilhão inimaginável para um jovem de apenas 20 anos.

Dizem que mais difícil que chegar no topo, é manter-se nele. Pois Medina terá que encarar mais este desafio. Mostrar ao mundo que 2014 não foi um conto de fadas, mas sim o início da supremacia de uma geração, obviamente liderada por ele, que pretende tirar de vez o cetro de Slater, Mick e Cia.

É hora de Gabriel festejar, de aproveitar sua boa energia, de ter orgulho de conquistar os sete mares, mesmo sem as mesmas oportunidades que australianos e americanos tem. Não me iludo com este papo de que o título é nosso. Este título é de Gabriel Medina, de sua família, do CEO da Rip Curl brasileira Felipe Silveira, que acreditaram e apoiaram um projeto, há alguns anos, e viram as sementes da fé tornarem-se um belo fruto. Nós, meros mortais, podemos até nos sentir vingados do tal preconceito ou do tal complexo de vira-latas, mas o fato é que podemos ter orgulho do sucesso de um brasileiro e seu staff alcançando suas metas de vida, honestamente e com muita trabalho, o que é raro num país onde a patifaria e desrespeito ao próximo estão tão latentes.

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Foto: Instagram Laura Azevedo

Que venha 2015, que Gabriel curta seu momento, porque em fevereiro a batalha continua, e agora serão todos contra ele, o número um, o campeão mundial.

- ASP / Kirstin Scholtz

– ASP / Kirstin Scholtz

- ASP / Laurent Masurel

– ASP / Laurent Masurel

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Chutômetro das ondas 19-12

Sábado dia 20 – Fracas condições com aproximadamente 0,5 metro, ondulação de leste/sudeste, e vento nordeste a leste com intensidade fraca a moderada. Melhores condições : Prainha

Domingo dia 21- Fracas condições com aproximadamente 0,5 metro, ondulação de leste/sudeste, e vento norte (terral) a leste com intensidade moderada. Melhores condições : Prainha

Foto: Minduim

Foto: Minduim

Way of Life dos Surfistas

Por Henrique Cesar Tupper

De todas as tribos que já conheci, os surfistas são de fato os mais descolados de todas. De um modo geral são dissociados do consumismo exarcebado de nossa sociedade atual, focados apenas em um fenômeno que ocorre na natureza: as ondas.

Sem saber com clareza absoluta de que tudo que os permite surfar é produzido do petróleo, (espuma; resina; fibra de vidro; cordinha; bermuda sintética; grip e parafina), agem de forma romântica se agarrando na bandeira ecológica da preservação ambiental e na busca de uma vida mais simples.

Vida simples que não exige luxo, nem muito conforto. Basta um bom equipamento para a prática do esporte e uma boa onda. Não interessa o lugar, desde que a onda seja boa. Para os surfistas, a rota dos países dos sonhos é Indonésia, Maldivas, Peru e outros lugares remotos e de bela natureza, mas com pouca infraestrutura. O Hawaii é uma das grandes exceções, mas, ainda assim, onde as grandes ondas rolam, fica em uma região mais isolada.

A tribo do surf precisa apenas curtir as ondas e de uma boa dose de natureza decorativa para ser contemplada. O contato com a água, com vida marinha e com o verde nativo das praias, nos remete a alguma coisa mais orgânica, primitiva e irracional de difícil explicação… Nos remete a alguma coisa mais natural, em equilíbrio com a nossa própria essência existencial. Diria até mesmo espiritual.

Em minha última viagem, tive a oportunidade de conhecer as praias de El Salvador: em sua grande maioria incrustada em uma região super pobre, literalmente favelas com esgotos abertos, mas com belezas naturais estonteantes.

Nós éramos ao todo 12. Todos estavam tão satisfeitos de estarem compartilhando aquele visual, aquela energia, que duvido que um “civil” tradicional de uma megalópole conseguisse entender como poderíamos estar nos divertindo tanto em um ambiente tão desprovido de recursos. Juntamente conosco, havia diversos canadenses e americanos que buscavam encontrar a mesma felicidade que compartilhávamos, no meio de toda a simplicidade que El Salvador possui.

Entendo hoje que se continuarmos consumindo compulsivamente da forma que a nossa sociedade atualmente consome, em breve não haverá mais recursos para todos. A exemplo disso, Rio de Janeiro, parte de Minas e principalmente São Paulo estão sinalizando que podem ter um esgotamento da oferta de água potável para a sua população. E o pior e mais alarmante: os governos desses estados ainda não conseguiram sinalizar que direção devemos tomar.

Enquanto isso, os surfistas parecem ter a resposta para um ‘way of life’ sem tanto consumo, mas com um nível de felicidade e harmonização com a natureza que deveria ser considerado por todos, se quisermos ter uma sociedade sustentável até os nossos netos.

Albert Einstein falava que “insanidade é fazer sempre a mesma coisa várias e várias vezes esperando obter um resultado diferente”. Deveríamos repensar sobre os nosso valores, não é?

El Salvador é um dos lugares maisconstantes de ondas do mundo. Foto: magicseaweed.com

El Salvador é um dos lugares mais constantes de ondas do mundo. Foto: magicseaweed.com

Chutômetro das ondas 12-12

Sábado dia 13 – Ondas subindo ao longo do dia, com ondulação de sul e vento terral forte pela manhã. As ondas devem ter aproximadamente 1 metro, com séries maiores no fim do dia. Melhores opções : Prainha, Macumba, Grumari e Barra da Tijuca na Zona Oeste e Pontão do Leblon na Zona Sul.

Domingo dia 14 – Onda com aproximadamente 1 metro, ondulação de sul e vento terral pela manhã, passando para sudoste a tarde. Mellhores opcões : Macumba, Grumari, Barra da Tijuca na Zona Oeste e Pontão do Leblon, Praia do Diabo e Copacabana Posto 5 na Zona Sul, principalmente quando entrar o sudoeste.


Foto: Minduim

Foto: Minduim

9 Pés

Sou fã do Canal Off  e nem preciso dizer porque. Gosto de quase todos os programas de surf, principalmente os feitos pelo Grupo Sal. Mas minha intenção não é enaltecer o canal, e sim os dois protagonistas do programa 9 Pés, Phil Rajzman e Chloé Calmon.  Os dois foram os melhores brasileiros na disputa do mundial de longboard, que terminou nesta semana, em Wanning, na Ilha de Hainan, na China.  Phil ficou com a segunda colocação no masculino e Chloé com a terceira no feminino. O que me veio a cabeça foi a importância que as viagens pelo mundo, feitas para a gravação do programa, tiveram nas performances do dois durante suas baterias do mundial. O programa tem sido uma aula de cultura de longboard e um show de surf, dos dois e de seus convidados ilustres, normalmente atletas de alto nível técnico.  Uma sessão em Olis Point, na Costa Rica, foi uma das melhores que já ví daquele pico. Na Califórnia, berço do longboard, não foi diferente. Freesurf em Malibu e outros picos tradicionais da costa oeste americana, misturado com visitas em grandes fabricas de pranchas, deram um destaque e valorização da modalidade.

Phil Razman comemorando o vice campeonato. Foto:ASP

Phil Razman comemorando o vice campeonato. Foto:ASP

Num momento difícil para o surf brasileiro, e nisso o longboard também está incluído, a falta de eventos da categoria já seria motivo para não termos bons resultados. Quem é, ou foi competidor, sabe que falta de ritmo de competição dificulta muito a conquista de uma boa colocação, principalmente em uma etapa única de mundial. Acho que tanto o Phil, quanto a Chloé, parecem estar num momento de vida muito bom, e o programa certamente colaborou para isso. Phil sempre foi um dos melhores do mundo, mas a falta de patrocínio, por um bom tempo, deu uma desanimada em seus objetivos competitivos. Acredito que agora ele se anime de novo, pois está com alguns patrocínios na prancha e com uma visibilidade que não tinha a algum tempo, o que pode gerar novos e bons contratos. Chloé, que tem menos tempo de carreira, nunca sofreu a falta de bons patrocínios. Apontada deste muito nova como a grande promessa do longboard feminino brasileiro, teve o suporte de seu pai e de seus patrocinadores para um caminho pavimentado até a conquista do terceiro lugar no mundial. Ainda é muito jovem, e tem grandes chances de se tornar campeã do mundo em muito pouco tempo. Dois craques da prancha que tem tudo para seguirem no topo do esporte.

Chloé Calmon em ação durante o mundial da China. Foto: ASP

Chloé Calmon em ação durante o mundial da China. Foto: ASP

Com foco total no possível título do WCT de Gabriel Medina, os brasileiros deixaram um pouco de lado outras conquistas recentes de nossos atletas. O vice campeonato mundial de Caio Vaz no SUP é um exemplo. O garoto é muito fera e deve ser campeão do mundo em breve. Nicole Pacelli foi campeã mundial de SUP ano passado e pouco destaque foi dado ao feito. Nossos Big Riders estão no nível dos estrangeiros e sempre estamos na disputa do XXL. Maya Gabeira tem sido a protagonista da categoria feminina desse prémio a alguns anos. Vamos enaltecer o feito de nossos dois longboarders, pois o Brasil nunca esteve tão bem representado em todas as modalidades do surf como agora. Podemos encerrar o ano com o título do WCT de Gabriel Medina, do WQS masculino de Filipe Toledo, do WQS feminino de Silvana Lima, o vice do Caio Vaz no SUP, o vice de Phil Rajzman e o terceiro de Chloé Calmon. Somos uma potência do surf mundial ou não somos ?

O Antagonista vem de lá

Depois de 14 anos a ASP entregou um troféu oficial de campeão mundial ao havaiano Sunny Garcia ontem durante a transmissão da triagem do Billabong PipeMaster 2014 in memory of Andy Irons. Entre 1990 e 2012, Sunny Garcia venceu 32 eventos da ASP: 2 do antigo Circuito Mundial, 7 do World Championship Tour e 23 do World Qualifying Series. Das 32 vitórias, 15 foram no Havaí. Único surfista a ganhar 6x a Tríplice Coroa havaiana, Sunny é, depois de Andy Irons, o mais vitorioso atleta vivo das ilhas do pacifico e sua figura polemica o faz até hoje uma lenda, ídolo e celebridade do esporte mundial.

Nada disso foi suficiente para que a ASP lhe desse um troféu até ontem (9/12). Pensando nas energias que o Havaí propaga e recebe em formas de onda, seria a quebra do troféu e a entrega de um novo um reflexo do que vai acontecer com o surf havaiano em 2015? O surf havaiano no âmbito competitivo andava mal das pernas desde a morte do Andy Irons. Só este ano senti algum movimento em prol de voltarem a antiga forma dominadora que praticavam nos áureos anos de Sunny e cia.

Sunny Garcia continua competindo após aposentadoria em 2005. Foto: ASP / Kirstin Scholtz

Sunny Garcia continua competindo após aposentadoria em 2005. Foto: ASP / Kirstin Scholtz

Quem acompanha meu trabalho sabe que sou fã da arte de surfar e não da bandeira que o surfista carrega. Sendo assim, obviamente sou fã do surfe havaiano assim como as ilhas que frequento anualmente. Na minha última temporada lá aluguei umas das casas da família Patacchia, entre Sunset e Rocky point. A casa é administrada pelo pai do atleta, shaper aposentado (diz ele que seu filho ainda usa suas pranchas) e homônimo do surfista profissional. Ao ver uma prancha shapeada pelo Wagner Pupo, Fred Patacchia Senior reconheceu seu par brasileiro e comentou a força da nova geração brasileira no tour. Morador do Hawaii a 20 anos, Fred Pai viu muitas gerações se formarem nas sete milhas da costa norte da ilha de Oahu. Assim começamos um longo papo sobre as diferenças entre as duas culturas, renovação e seus novos atletas. Curiosamente, o veterano admitiu a ausência de novos nomes havaianos com destaque no QS e reafirmou a dominância dos atletas brasileiros. Orgulhoso enchi o peito para dizer que a próxima nação a dominar o esporte seriamos nós porém também lamentei a falta de novos nomes por parte deles. E foi aí que me espantei com a justificativa dele: “O problema da nova geração havaiana é que eles sofrem de homesick”. Homesick = saudades de casa. Os atletas havaianos não aguentam a pressão de tantas viagens e ondas de baixa qualidade enquanto sabem que em casa podem usufruir de ondas de maior qualidade. Quando você ouve uma coisa dessa, com a mentalidade de quem mora em local de ondas ruins, logo pensa: “Que besteira, todo ano eles podem surfar na melhor época as ondas do Havaí”. Com a credibilidade de ser pai de um dos atletas de ponta o mesmo afirma que Fred Patacchia Jr reclama muito quando está fora de casa mas o faz por profissionalismo. E ainda reforça: “Os novatos não tem maturidade para aguentar as dificuldades de viajar grande parte do ano e receber mensagens de ondas perfeitas em casa”. Resumindo, quando você nasce em uma ilha de ondas perfeitas, se ausentar de casa é ruim, segundo ele. Ainda notei que os novatos citados por ele admiram mais atletas como Jamie O’brien, Matt Meola e Ian Walsh do que os que competem o tour. Uma das razões pode ser porque mercado de freesurfing vem crescendo muito e os havaianos sabem e podem tirar vantagem disso por um custo muito mais barato e, mais uma vez, devido aos benefícios geográficos. Hoje a maioria dos surfistas do Havaí com destaque na mídia são freesurfers. Somente Dusty Payne e agora Keanu Asing (esse vai ser café com leite, convenhamos rs) serão novidades no time que representará os nativos das ilhas havaianas no tour 2015.

Fred Patacchia Jr continua levantando a bandeira havaiana no tour 2015. Foto:ASP / Kirstin

Fred Patacchia Jr continua levantando a bandeira havaiana no tour 2015. Foto:ASP / Kirstin

Dusty Payne também é um caso à parte. Surfei com ele em Salinas Cruz e ao vivo foi um dos melhores que já vi. No mesmo ano foi desclassificado do tour. Seria o homesick a causa disso? Além desta síndrome clássica, o atleta de Maui é proveniente de uma família muito rica. Um amigo que já trabalhou para empresa que o patrocina uma vez me contou que a meta dele era vencer uma etapa do WCT e depois viraria freesurfer de vez. O objetivo era somente se divertir perto de casa. Até porque o 1º cartão de credito Amex Black que esse meu amigo viu foi na mão dele. Do outro lado do ranking está a aposta deles, o menino prodígio John John Florence. Arrisco dizer ser o melhor havaiano a pôr uma lycra de competição depois do ídolo Andy Irons. Se conseguir desenvolver sua fome competitiva será uma pedra no sapato do Medina.

Medina e John John, os melhores em 2015? Foto:Photo: Grind TV/ASP

Medina e John John, os melhores em 2015? Foto:Photo: Grind TV/ASP

Sunny Garcia agora tem seu troféu, mas o formato competitivo da ASP ainda não atrai os atletas moradores de ilhas com ondas perfeitas. Os brasileiros sonham com as viagens para surfar e melhorar a técnica nessas ondas. Os havaianos deixam de treinar em ondas boas quando viajam em busca de pontos. O Brasil é o país que mais cresce em número de integrantes do tour, o Havaí não. O Havaí já teve alguns campeões mundiais da 1ª divisão, o Brasil ainda não tem. Brasil tem o melhor surfista da atualidade. O Havaí não tem. O Brasil não tem mais campeonato nacional mas tem uma multidão faminta por disputar o título. O Havaí tem cada vez menos jovens querendo viajar para competir fora de casa. O Brasil não tem um freesurfer que inspire a juventude, o Havaí tem vários. O Havaí tem ondas world class que atraem o mundo todo, o Brasil não. O Brasil tem o Medina. O Havaí tem o John John. Benvindo 2015.

 

 

Já temos um campeão

Enquanto esperamos ansiosamente pelo desfecho da disputa entre Gabriel Medina, Kelly Slater e Mick Fanning, pelo título do WCT 2014, já podemos comemorar o título do WQS, conquistado por Filipe Toledo. Parece algo menor para muitos, mas vejo de outra forma. A luta pelas 10 vagas para a divisão de elite é muito forte, com atletas da nova geração, surfistas locais de bom nível tecnico e atletas do WCT, que não confiam na reclassificação pelo circuito dos sonhos, ou que buscam boas premiações e destaque. Os eventos tem formato diferente, onde uma maratona de baterias impera. Na minha opinião, chegar numa final de WQS é tão complicado quanto chegar numa final de WCT. Filipinho chegou em duas finais de prime e venceu as duas, lembrando que em Maresias foi covardia a maneira como encarou seus adversários. Esse título pode dar mais segurança para ele entrar em 2015 com maiores pretensões no World Surf League, novo nome do circuito no próximo ano. Tenho a maior fé nele, que é apontado por muitos como o surfista mais criativo do momento.

Wiggolly Dantas e Italo Ferreira também merecem destaque. Conseguiram se classificar entre os dez melhores para a divisão de elite 2015 e vão ocupar os lugares de Raoni Monteiro e Alejo Muniz, que não tiveram um ano bom. Continuaremos com 7 atletas para torcer pelo título, isso se a ASP não convidar o Alejo para uma das vagas de contusão, ou Tomas Hermes, com remotas chances, conseguir sua vaga. Ele finalizou com a décima sétima colocação do WQS  e precisa torcer para alguns atletas que se classificaram pelo QS se classifiquem pelo WCT. Pensando na melhor hipótese, teriamos 9 entre os 36 melhores do planeta. Vamos torcer e aguardar !!

Filipe Toledo campeão do WQS 2014.Foto:ASP/Daniel Smorigo

Filipe Toledo campeão do WQS 2014.Foto:ASP/Daniel Smorigo