O corporativismo

Foram muitos comentários sobre a minha opinião na matéria “Eles São Os Grandes Culpados”, alguns úteis, outros inúteis, de acordo com a capacidade intelectual de cada um. O fato é que achei interessante a defesa em bloco da turma, no caso os “pros”, que se sentiu ofendida. Coincidência também que todos os textos a favor das minhas palavras fossem de não surfistas profissionais e seus amigos. Alguns com, outros sem, ligação alguma com o segmento.

Veja bem, corporativismo não necessariamente é negativo. Se for pro bem de um todo, é aceitável. Só que não acho que esta seja a situação. Muitos destes que reclamaram, talvez todos, não tem ciência de como o Circuito Brasileiro de Surf Profissional apareceu. Eles não sabem, que o embrião de tudo foi a união de um grupo de profissionais cariocas, em 1985, que resolveu fazer um Circuito de algumas etapas e se mobilizaram com seus patrocinadores e conhecidos para que fizessem um pool de empresas dando a mínima condição de estrutura e premiação, dando surgimento a Organização dos Surfistas Profissionais do Rio de Janeiro, a OSP. Daí para a criação da ABRASP foi um pulo. Um bom exemplo de corporativismo.

O começo da OSP em 1985. Pedro Muller, Fred D'orey, Mario Cesar Pereira Carneiro, Valdir Vargas e Ricardo Bocão. Foto: Roberto Price

O começo da OSP em 1985. Pedro Muller, Fred D’orey, Mario Cesar Pereira Carneiro, Valdir Vargas e Ricardo Bocão. Foto: Roberto Price

O grande problema, é que quem surgiu no pedaço no século XXI recebeu toda a estrutura montada, com o trabalho de Roberto Perdigão e Marcelo Andrade, junto de uma penca de surfistas da velha geração que conseguiram pegar um sonho e transformá-lo em realidade. Óbvio que tiveram coisas contestáveis, mas olhando o resultado nestes 25 anos, desde 87, é impossível dizer que não deu certo, ao menos até agora.

Sempre bati na tecla de que os atletas quiserem chegar a algum lugar, independente do talento, devem ser regrados, estudarem, ficar longe das drogas e saber se comportar como um produto comercial. Já escutei diversas vezes tarimbados surfistas, alguns até do WCT, dizerem que o que importa é dentro dágua… Não existe maior burrice! Lógico que se o cara dá resultado será mais fácil de arrumar um bom apoio, mas no fundo, o que importa é se a pessoa cumpre com os acordos fechados num contrato, como se portar bem, comparecer as compromissos com a empresa e manter sua imagem positiva.

Tiger Woods, para quem não sabe o atleta mais rico do mundo em todos os tempos, com 1 bilhão e 300 milhões de dólares em faturamento, perdeu 90% dos seus patrocínios depois do escândalo do vício em sexo há quatro anos. Agora imagine um surfista que não sabe dar uma entrevista, falar na rádio, TV, que se enrola quando tem que responder uma pergunta em inglês, que faz gestos obscenos numa bateria, que é pego no antidoping, que agride alguém…

Muitos comentários foram sobre os atuais competidores, que eles não são mais assim… Concordo e discordo. O nível melhorou muito no que diz respeito a elite. É visível o preparo de Adriano, Medina, Miguel, Filipe, Alejo, Jessé o próprio Junior Faria, que além de ter uma coluna interessante da Hardcore, conseguiu debater em alto nível. Só que estes caras, não estão muito aí para o Circuito Brasileiro. O mundo deles é maior. Eles querem e podem alcançar feitos que a maioria não pode e nem vai.

O próprio Faria admitiu que “À época, mesmo reunindo algumas cabeças pensantes da elite do surfe profissional, naufragamos precocemente porque não houve repercussão no nosso próprio meio. Tampouco houve a união necessária para que nossos ideais fossem levados adiante.”

Este é o retrato. Tem gente que prefere se defender de acusações que não foram feitas – não disse que TODOS são drogados nem BURROS – ao invés de tirar o bumbum da cadeira e fazer algo. E este algo não é ligar para o Pedro Falcão, diretor-executivo da ABRASP, e pedir uma reunião para cobrar o que não está sendo feito. Faça-se uma pergunta: Você pagaria 100.000 reais para reunir 100 caras, que nem são os melhores surfistas do Brasil num evento de formato antiquado, nada atrativo para a mídia digital, reunindo nomes que apesar de serem extremamente talentosos são totalmente desconhecidos do público em geral?

Enquanto os corporativistas preferem se defender e atacar, o tempo passa e a probabilidade deles se tornarem pedreiros, caseiros, segurança (tudo trabalho honesto) ou qualquer ofício que não seja ligado ao que amam – surfar – é maior. Não se iluda, esta gente já existe. E continuará a existir. Só que as oportunidades de crescer poderiam ser melhores caso as decisões e objetivos sejam em prol de um bem maior. Assim como o BOM SENSO, grupo de jogadores de futebol que se uniu para melhorar as condições de trabalho do ramo, o surf precisa de algo similar. Mas se depender desta galera e da forma com que pensam, uma pequena parte da molecada vai sair aos 15 anos de casa de olho no WQS, mirando o WCT, esquecendo que o Brasil existe. E se falhar ou retornar mais tarde, verá que sua profissão nunca existiu, foi apenas uma nuvem que estagnou no céu até ser varrida pelos ventos do tempo.

Paulinho do Tombo foi o primeiro campeão brasileiro em 1987. Fonte: Blog Dragão

Paulinho do Tombo foi o primeiro campeão brasileiro em 1987. Fonte: Blog Dragão

1 Response

  1. Evandro 9 de abril de 2016 / 10:16

    Saudades de Roberto Perdigão e Marcelo Andrade!

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